O Caminho do Viver, do Morrer e do Renascer

Projeto Templo Odsal Ling, São Paulo

Templo Odsal Ling, Cotia, SP

Findo o retiro de pintura do nosso Odsal Ling, que se iniciou na segunda feira passada e terminou neste domingo (espero que um dos blogueiros do blogsattava que esteve no retiro possa nos dar “uma palhinha”), Lama Tsering programou uma visita ao campo para que todos pudessem contemplar, a meu ver, o ciclo da vida.

Eu, que não pude estar no retiro, infelizmente, tive, por outro lado, a benção de poder ir a essa visita ao campo do viver e do morrer e do rensacer (claro, a minha concepção de nossa visita).

Lama Tsering traz vida aos ensinamentos do Dharma, de uma forma, ou de outra, ela faz do Odsal Ling, de nossa prática, dentro ou fora dele, uma lição de vida, um preparo para tantas vidas. Que idéia magnífica, de tamanha intensidade, que me fez pular da cama de madrugada para não perder um só minuto deste domingo encantado.

Pois bem, findo o “puja”, a nossa prática dos domingos, prática de Tara Vermelha concisa,

Tara Vermelha

o programa foi ir a campo e visitar a vida, primeiro uma visita às velhilhas do Capuava, no Município de Cotia, São Paulo, em uma casa de idosos, que todas as semanas, impreterivelmente, a Diana vai visitá-las e leva consigo a Candinha, a Maria Ruth, nossas veteranas no caminho; e lá costumam frequentar semanalmente.

Só que dessa vez, baixamos no lugar em turma. Foi uma folia, via-se no rosto de cada um daquelas velhinhas (algumas não tão velhinhas assim, talvez tão sozinhas, para mim) a alegria de ver a mocidade chegando. Mas não foi só alegria também.

Vi tristeza, de pessoas que viam a vida chegando ao fim, algumas acompanhadas, seus familiares a visitá-las, outras sozinhas, ausentes de suas famílias, mas sem exceção, senti em todos o sentido de sentir que se está a caminho de um outro lugar. Algumas, ainda faziam questão de esquecer essa sensação, outras não.

Contemplei aquilo tudo com muito de minha interioridade, embora externamente brincava, conversava e procurava fazê-las rir, passar um pouco, ou o que pude, do jovem que ainda tenho dentro de mim.

Fiz questão de beijar a mão de todas elas, em sinal do meu respeito pelo respeito que elas tanto deram e continuam dando à vida.

Para mim –  acredito que para todos nós – tudo aquilo foi uma lição de vida, uma lição também de que a morte, mesmo para aqueles que, como essas pessoas que visitamos, tiveram a sorte de chegar tão longe no curso dessa vida, que essa morte antecedida da velhice, seja ela curta, seja ela longa, é parte intrínsica de nossas vidas.

De lá seguimos para um breve almoço. Que maravilha!

Um almoço com nossos Lamas, tão informal, que benção foi esta que tive, ou melhor que todos pudemos ter, afinal, estar assim pertinho deles, além de nossas fronteiras, não é para toda hora.

Partimos, então para o cemitério, conversa para lá , conversa para cá, entendimento aqui e ali: sim, o cemitério da Consolação, o escolhido!

De certa forma fiquei feliz; afinal, é lá que estão enterrados os membros da minha familia

Cemitério da Consolação, Capela Familiar

Capela Cemitério da Consolação São Paulo

e tantos amigos da São Paulo de outrora. Com esculturas homenageando seus mortos, São Paulo, fez do Cemitério da Consolação, uma obra de arte em praça pública. Como a famosa escultura, o “Sepultamento”, de Victor Brecheret, em honra de Dna. Olívia Guedes Penteado [ foto abaixo ] ou do escultor italiano, Luigi Brizzolara, que decorou a capela  dos Mattarazos [não fotografada], ambas famílias de grande influência no cenário social, cultural e empresarial paulistano da primeira metade do século passado.

O Sepultamento, Victor Brecheret

"O Sepultamento", Victor Brecheret, Escultura, Cemitério da Consolação, São Paulo, Brasil

Mas logo percebemos que tudo aquilo era como uma continuação do que acabávamos de ter vivenciado, junto às nossas velhinhas de Cotia, da Estrada do Capuava. De uma forma ou de outra, chegaríamos à Consolação, ou algum outro lugar onde os vivos abrigam seus mortos; onde a vida termina e outra começa…

E foi então — acho eu — o mais lindo de tudo, eis que, espontaneamente, nos postamos em roda a ouvir os ensinamentos de nossa Lama, Lama Tsering – sempre ensinando –

Ensinamentos na cidade de Lama Tsering Everest a seus alunos

Ensinamentos na cidade de São Paulo de Lama Tsering Everest a seus Alunos

e passamos a contemplar sobre o fato de que aquelas pessoas ali um dia enterradas não são somente pessoas que por aqui passaram certa época, mas, sim, seres que de uma forma ou de outra tiveram conexões com nós mesmos em outras vidas e que as encontraremos no futuro em tantas outras vidas por vir. Falamos das práticas, do tempo da vida, que mesmo vivida, ainda que intensamente, deve ser uma prática de nossa passagem em direção ao caminho, em benefício, sempre, de todos. E, assim, nos sentamos ao chão e nos pusemos a ouvir e, por fim, a orar e a dedicar o mérito daqueles ensinamentos a todos os seres.

Dedicação do Mérito

Dedicação do Mérito dos Ensinamentos Recebidos de Lama Tsering Everest

Interessante notar o quanto nossa cultura cuida de seus mortos, dedicando-lhes, as vezes, obras monumentais, as vezes obras nenhumas, as vezes sequer lembranças. Mas alguns de nós, hoje presentes, retrataram, de forma interessante, esse aspecto cultural de nossa sociedade ocidental, do lamento, do choro e da tristeza dos que partem:

Luto de uma mãe

Luto de uma Mãe

Choro em Branco e Preto

Choro em Branco e Preto

Voltamos, então,  em alguns grupos, ao Odsal Ling; eu mesmo tive que fazê-lo, pois tinha comigo um grupo maravilhoso de caronas.

Porém, eu havia ouvido que, originalmente, o plano de nossas visitas incluia, talvez, uma visita a uma maternidade. Aquilo havia me tocado muito. Principalmente, quando pensava sobre o assunto no final do passeio, porque havíamos passado pelos idosos e pelos mortos e ver os recém nascidos, para mim, era a complitude de um ciclo.

Então resolvi colocar em prática, mesmo que sozinho, a parte final do passeio, que significou, a meu ver, o recomeço da vida, nesta experiência de vida, de vê-la de outra forma, de senti-la de outro jeito, uma visão transcendental do cotidiano de muitos.

Pois bem! Sai do Odsal Ling e lá fui eu para a maternidade do Hospital Albert Einstein ver todos aqueles bebês nascidos, nascendo, renascidos e renascendo. Quantos deles não seriam, quem sabe, alguns dos mortos que visitamos? Quanta alegria naquela maternidade: felicidade era a palavra e os pensamentos daquele lugar. Imaginei, quão maravilhoso aquilo tudo, o nascimento humano.

Nascimento, Renascimento

O Nascimento, O Renascimento da Vida Humana

Fiquei contemplando e contemplando e comparando com tudo que tinha acontecido nesse dia inesquecível em que nossa Lama nos mostrou o caminho da vida, ou melhor o caminho do viver, do morrer e do rensacer.

Espero que um dia possamos repetir esse passeio, quem sabe com outros grupos, que possam ter essa mesma experiência, inesquecível, com certeza.

Sobre Marcelo Thiollier

No caminho, felicidade tem outro nome. On the path, happiness has another name.
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2 respostas para O Caminho do Viver, do Morrer e do Renascer

  1. Pingback: Mais sobre o passeio | blogsattva

  2. Nancy Yasuda disse:

    Obrigada por compartilhar essa linda experiência… Aliás, obrigada a todos pelo blog, uma maravilhosa manifestação de generosidade que nos ajuda a participar mais das atividades do Odsal Ling, mesmo que de longe…

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